Um punk foi morto na porta de um show por um grupo nazista. Não foi na Áustria, foi em São Paulo. E essa história não vem de hoje.
Aprendemos a respeitar os punks pela coragem de denunciarem as mazelas da cidade: vimos campanhas antifascistas, feministas (foram grupos punk que começaram com o uso do @ para não discriminar sexo, p.ex. em amig@s), contra a discriminação racial e a violência policial. Você pode não gostar da música deles, mas não há dúvida que eles são a expressão mais sofisticada de ação política progressista na periferia das grandes cidades. Além disso, admiramos também os coletivos punks por não endeusarem seus líderes e por buscarem, na aridez de uma cidade como São Paulo, o afeto e a pertença a uma família ampliada que não reproduza os vícios da família burguesa tradicional, alienada do meio em que vive.
E também tem os skinheads. Parte deles sintoniza-se com os punks nos ideais libertários - já estivemos em manifestações em que skinheads anarquistas protegiam a passeata. Infelizmente, tornaram-se mais conhecidos pela sua facção fascista, marcada pela violência e por uma plataforma de direita radical que é o oposto dos punks: agridem pessoas pela cor, por serem nordestinos, têm horror aos homossexuais e as mulheres, bem, as mulheres nunca deveriam ser mais que mães pra eles.
Há uma guerra nem tão surda assim entre punks e skins. Você pode acompanhá-la nos jornais, mas nós a vivemos dentro de casa. A Tribo nunca foi neutra em relação ao território que ocupava. Na década de 90, quando tínhamos uma sede perto do metrô Santa Cruz, em São Paulo, convivemos com vários grupos punks e convidamos um dos coletivos para trabalhar conosco em acabamento gráfico. Foi o que bastou: um grupo de skinheads do bairro considerou a presença dos punks uma provocação e invadiu a nossa sede, pistola em punho, barras de ferro na mão, procurando-os. A reação do pessoal do acabamento - um grupo de mulheres corajosas e difíceis de intimidar - afastou-os. Mas passamos algumas semanas de sobreaviso, vendo-os rondar a área.
Fizemos, então, algo que nos vinte anos da Tribo nunca aconteceu de novo: chamamos a polícia. Identificados, eles se afastaram.
A grande mídia vai sempre apresentar a todos como desordeiros. Punks, carecas, todos iguais: uma unidade feita da insignificância que os atores sociais têm para quem considera notícia a vida privada do Luciano Huck.
Mas esta Tribo sabe: punks e carecas não são a mesma coisa.